quinta-feira, 25 de março de 2010

Exposição sobre a República

Em Maio de 1867, Eça de Queiroz reflectia: «As revoluções não são factos que se aplaudam ou se condenem (...). São factos fatais. Têm de vir. De cada vez que vêm é sinal que o homem vai alcançar mais uma liberdade, mais um direito, mais uma felicidade.»
Com efeito, o movimento revolucionário ocorrido no dia 5 de Outubro de 1910 marcou, de uma forma irreversível e expectante, o devir da nossa História. Ao recordarmos um século sobre a sua passagem procuramos, mais do que o simples comemorativismo, cumprir a função social que mantém e actualiza a sua relevância.
Conscientes do papel da Escola e, em particular, da disciplina de História, na criação de um espaço e de um tempo onde, pedagogicamente, se pode integrar esta data, o Grupo de História da Escola Secundária com 3º CEB Gil Eanes (Lagos) procurou, em colaboração com a equipa da Biblioteca, levar a cabo uma exposição subordinada ao tema «Ditosa Pátria, minha amada!» que, através da recriação de uma sala de aula (da 1ª República ao Estado Novo), permitiu aplicar e aprofundar conhecimentos dos alunos, debater experiências, colocar questões e reflectir sobre o conceito de cidadania.
Quisemos mostrar que a 1ª República foi desejada como um factor de mudança. Anunciou-se como democrática. Implantou-se como uma ruptura. Foi vivida como uma revolução. Sentiu-se como uma força libertadora. Mobilizou multidões. Criou expectativas. Alimentou sonhos. Aguçou desilusões…
Quando a República foi implantada, Portugal era um país com uma população que quase atingia os seis milhões de habitantes na sua maioria vivendo nos campos, e dividida, segundo o historiador Oliveira Marques, em três estratos: burgueses ricos, com ligações ao sistema bancário, ao grande comércio e à propriedade fundiária; classe média, maioritária nas grandes cidades, constituída por pequenos comerciantes e industriais, membros das profissões liberais, funcionalismo e por pequenos e médios proprietários rurais; «povo miúdo», ainda insuficientemente evoluído, constituído por pequeníssimos proprietários rurais, por jornaleiros e criados da lavoura, por operários industriais.
A classe média, que tinha feito a revolução, herdou uma conjuntura preocupante: uma crise social provocada pelo crescimento agrícola em detrimento do desenvolvimento industrial e pelo afluxo marcado da população às grandes cidades; uma crise económico-financeira, marcada pela falência de bancos, aumento da dívida pública e pela contracção do investimento; uma crise moral, com frequentes escândalos públicos de corrupção; uma sociedade repleta de analfabetos...
Para vencer esta crise generalizada o pensamento republicano procurara algumas fórmulas resolventes: ser republicano significava ser contra a Monarquia, contra a Igreja e os Jesuítas, contra a corrupção política e os partidos monárquicos, contra os grupos oligárquicos, mas também pela afirmação categórica de princípios de defesa do municipalismo, do federalismo, do associativismo, do sufrágio universal, do predomínio do legislativo sobre o executivo, da defesa da liberdade e dos direitos dos cidadãos. A «educação republicana» seria uma das vias fundamentais para a concretização deste ideário, uma educação voltada para o «esclarecimento das consciências, condição indispensável ao advento de uma sociedade mais livre, mais justa e mais humana».
A República viria a cair em 1926, na sequência de um golpe militar. Seguiu-se-lhe um longo regime de ditadura cuja acção, em termos de ensino genericamente considerado, desmontou, passo a passo, as ideias republicanas mais positivas. A escola tornou-se, então, o palco privilegiado para a inculcação dos valores defendidos pelo Estado Novo. Os manuais escolares, livros únicos para o então Ensino Primário, criteriosamente seleccionados pelo Ministério da Educação Nacional e adoptados por longos anos, dão-nos imensos exemplos dos valores defendidos: a glorificação da obra do Estado Novo e do seu líder, Salazar; o papel subalterno da mulher, limitada à função de esposa e mãe; a caridade que, quantas vezes, substituía a função social do Estado; a catequese, incutindo os rudimentos da doutrina católica; a gloriosa História pátria que transformava Portugal na Nação mais bela do mundo e de que o Estado Novo era o mais legítimo herdeiro. Enfim, acreditava-se ser este o mundo perfeito, sem violência, sem vícios, sem protestos, perfeitamente ordenado, traduzindo uma ordem económica, política e social que o Estado Novo considerava intocável, absoluta…
Foi o olhar sobre este passado – para uns recente, para outros (mais novos) quase inexistente – que a exposição procurou recuperar, em jeito de brincadeira séria!
A todos os que de alguma maneira proporcionaram a sua concretização, o nosso «muito obrigada»!

Sem comentários: